A década de 70 ficou conhecida como a década da discoteca, a
deixa para isso foi Os Embalos de Sábado
a Noite, estrelado por John Travolta. O Brasil caiu nas pistas de danças e
também deu atenção a nomes que hoje são muito importantes para a música brasileira.
Raul Seixas, que
surgiu no final da década de 60, ganhou mais atenção aqui, ao lançar o seu
consagrado Gita. Gilberto Gil, Maria Bethânia, Gal Costa e Caetano Veloso marcaram
época com Doces Bárbaros; e Rita Lee deixou os Mutantes e fez
sucesso com Tutti Frutti.
O punk
também teve um importante espaço na década de 70, conquistando o Brasil com
bandas como Aborto Elétrico e Cólera.
Raul Seixas teve para compor suas
músicas a parceria de Paulo Coelho, e tem muitas de suas músicas inspiradas nas
idéias do ocultista Aleister Crowley. Falava muito de liberdade, na utopia de
Sociedade Alternativa. Nosso maluco beleza diz ser louco pela Menina de
Amaralina, pedindo para que ela volte para ele “por favor”:
“Agora a praia
chora
Querendo lhe rever
Nem mais a lua quer
Lá no céu aparecer
Menina de
Amaralina
Volte por favor.”
E se refere à loba que tem tranças onde ele se
enreda, que não é mais criança, é bem vestida em seu nylon e o abocanha.
“Me abocanha na hora da mesa
Com seu olhos de olhar perdigueiro
Seus pais não sabem o que fizeram
Um diabo
sexy e traiçoeiro.”
Gilberto Gil canta a história de Maria, que é um dom, uma
certa magia:
“Maria, Maria, é o som, é a
cor, é o suor
É a dose mais forte e lenta
De uma gente que ri quando deve chorar
E não vive, apenas agüenta ”
É a dose mais forte e lenta
De uma gente que ri quando deve chorar
E não vive, apenas agüenta
Parece que o nosso digno
Gilberto Gil era chegado em Maria. Pede em outra canção para que ela o perdoe,
por não ver no sorriso dela o sorriso das flores. Será que ao se referir a
Maria, Gilberto Gil não está fazendo uma referência a todas as mulheres?
Mulheres que possuem um olhar cinzento das tardes sem sol, mas sempre amorosas,
para as quais o mesmo ensina a seguinte lição:
“Nem todas as flores são
flores
Nem toda beleza são cores
Você não sorri como a flor
Mas nem sei se na flor
Há o amor
Que existe em você ”
Gilberto Gil apresenta
ainda em A Deusa da Minha Vida, a mulher utópica retratada anteriormente pela
bossa nova. Mulher que tem os olhos onde a lua costuma se embriagar, e quando
ela passa, faz a rua sem graça se transformar em paisagem de festa.
Não é
curioso o fato de que a deusa da vida de Gilberto Gil, uma mulher tão utópica,
tenha os olhos brilhantes de lua, enquanto Maria, a mulher real, tenha os olhos
cinzentos das tardes sem sol? Parece-me um retrato infeliz, onde a mulher ainda
é reprimida e sua plenitude é apenas utopia. Por esse ângulo, Gilberto Gil foi
um excelente fotógrafo musical.
Rita Lee, a importante
mulher do rock brasileiro, polêmica e revolucionária, trouxe em suas letras um
retrato igualmente polêmico e inusitado sobre a mulher. “As Loucas” nos remete
a história das prostitutas: Eles se casam com as outras, mas amam as loucas,
porque as loucas é que são fatais. Percebe-se a velha divisão da mulher onde
por um lado está a que é para casar e ser apresentada socialmente, e por outro
lado está a que é para satisfazer os desejos dos homens.
Tal retrato podia até ser
visto, mas talvez não fosse falado com tanta clareza. Rita Lee não para por aí e
ao faz um relato sobre os desejos das mulheres, afirmando que todas elas querem
ser amadas, todas elas se fazem de coitadas e todas elas querem ser felizes:
“Toda mulher quer ser amada
Toda mulher quer ser feliz
Toda mulher se faz de coitada
Toda mulher é meio Leila Diniz ”
É importante dizer
que, para quem não sabe, Leila Diniz foi a polêmica que exibiu pela primeira
vez a sua gravidez ao usar biquíni, quebrando os tabus da época onde a
repressão feminina dominava, ganhou um espaço digno na letra de Rita Lee.
A submissão de uma garota
chamou a atenção da Aborto Elétrico, banda que deu origem à Legião Urbana na
década de 80, e essa foi relatada nas linhas de Submissa:
Submissa
Tudo o que eu mandava
Ela fazia
Tudo o que eu queria
Ela fazia
Tudo o que eu sonhava
Ela fazia
Submissa”
Era uma onda de submissão.
Mas Cólera, que surgiu na zona leste de São Paulo, chegou questionando bem alto
com sua guitarra distorcida e seu grito punk: Por Que Ela Não?
“Ela, porque ela não?!
Crime, discriminação
Ela não pode, não pode querer
Ela não pode, não deve pensar
Ela não pode, não pode viver
Ela não pode, não deve falar
É, as minas não tem vez
São troféus, troféus pra vocês
Sem opção, nem opinião
É a lei de um povo cão”
Crime, discriminação
Ela não pode, não pode querer
Ela não pode, não deve pensar
Ela não pode, não pode viver
Ela não pode, não deve falar
É, as minas não tem vez
São troféus, troféus pra vocês
Sem opção, nem opinião
É a lei de um povo cão”
Depois da libidinosa
loba de Raul, da Maria de olhos cinzentos como as tardes sem sol de Gilberto
Gil, de Todas As Mulheres e de As Loucas de Rita Lee, da Submissa de Aborto
Elétrico e da pergunta que não quis calar no final da década de 70, percebe-se
que o retrato da mulher começou a ganhar cor. Começou-se a retratar uma mulher
desejada, ainda submissa, mas começando a ter voz. Parece que nesta década, os
artistas as queriam ouvir.
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