sexta-feira, 29 de março de 2013

ANOS 70 - TEMPO DA TROPICÁLIA


A década de 70 ficou conhecida como a década da discoteca, a deixa para isso foi Os Embalos de Sábado a Noite, estrelado por John Travolta. O Brasil caiu nas pistas de danças e também deu atenção a nomes que hoje são muito importantes para a música brasileira.

Raul Seixas, que surgiu no final da década de 60, ganhou mais atenção aqui, ao lançar o seu consagrado Gita. Gilberto Gil, Maria Bethânia, Gal Costa e Caetano Veloso marcaram época com Doces Bárbaros; e Rita Lee deixou os Mutantes e fez sucesso com Tutti Frutti

O punk também teve um importante espaço na década de 70, conquistando o Brasil com bandas como Aborto Elétrico e Cólera.

Raul Seixas teve para compor suas músicas a parceria de Paulo Coelho, e tem muitas de suas músicas inspiradas nas idéias do ocultista Aleister Crowley. Falava muito de liberdade, na utopia de Sociedade Alternativa. Nosso maluco beleza diz ser louco pela Menina de Amaralina, pedindo para que ela volte para ele “por favor”: 

Agora a praia chora
Querendo lhe rever
Nem mais a lua quer
Lá no céu aparecer
 Menina de Amaralina
Volte por favor. 

E se refere à loba que tem tranças onde ele se enreda, que não é mais criança, é bem vestida em seu nylon e o abocanha. 

Me abocanha na hora da mesa
 Com seu olhos de olhar perdigueiro
Seus pais não sabem o que fizeram
Um diabo sexy e traiçoeiro. 

Gilberto Gil canta a história de Maria, que é um dom, uma certa magia:
Maria, Maria, é o som, é a cor, é o suor
É a dose mais forte e lenta
De uma gente que ri quando deve chorar
E não vive, apenas agüenta
Parece que o nosso digno Gilberto Gil era chegado em Maria. Pede em outra canção para que ela o perdoe, por não ver no sorriso dela o sorriso das flores. Será que ao se referir a Maria, Gilberto Gil não está fazendo uma referência a todas as mulheres? Mulheres que possuem um olhar cinzento das tardes sem sol, mas sempre amorosas, para as quais o mesmo ensina a seguinte lição:
                                              “Nem todas as flores são flores
Nem toda beleza são cores

Você não sorri como a flor
Mas nem sei se na flor
Há o amor
Que existe em você

Gilberto Gil apresenta ainda em A Deusa da Minha Vida, a mulher utópica retratada anteriormente pela bossa nova. Mulher que tem os olhos onde a lua costuma se embriagar, e quando ela passa, faz a rua sem graça se transformar em paisagem de festa. 
Não é curioso o fato de que a deusa da vida de Gilberto Gil, uma mulher tão utópica, tenha os olhos brilhantes de lua, enquanto Maria, a mulher real, tenha os olhos cinzentos das tardes sem sol? Parece-me um retrato infeliz, onde a mulher ainda é reprimida e sua plenitude é apenas utopia. Por esse ângulo, Gilberto Gil foi um excelente fotógrafo musical.
Rita Lee, a importante mulher do rock brasileiro, polêmica e revolucionária, trouxe em suas letras um retrato igualmente polêmico e inusitado sobre a mulher. “As Loucas” nos remete a história das prostitutas: Eles se casam com as outras, mas amam as loucas, porque as loucas é que são fatais. Percebe-se a velha divisão da mulher onde por um lado está a que é para casar e ser apresentada socialmente, e por outro lado está a que é para satisfazer os desejos dos homens. 
Para o jantar, as educadas
Para o noivado, as comportadas
Para um negócio, as poucas
Para uma sacanagem, as loucas
 

Tal retrato podia até ser visto, mas talvez não fosse falado com tanta clareza. Rita Lee não para por aí e ao faz um relato sobre os desejos das mulheres, afirmando que todas elas querem ser amadas, todas elas se fazem de coitadas e todas elas querem ser felizes:

Toda mulher quer ser amada

Toda mulher quer ser feliz
Toda mulher se faz de coitada

Toda mulher é meio Leila Diniz

É importante dizer que, para quem não sabe, Leila Diniz foi a polêmica que exibiu pela primeira vez a sua gravidez ao usar biquíni, quebrando os tabus da época onde a repressão feminina dominava, ganhou um espaço digno na letra de Rita Lee. 


A submissão de uma garota chamou a atenção da Aborto Elétrico, banda que deu origem à Legião Urbana na década de 80, e essa foi relatada nas linhas de Submissa:


Conheci uma garota 
Submissa
Tudo o que eu mandava
Ela fazia
Tudo o que eu queria
Ela fazia
Tudo o que eu sonhava
Ela fazia

Submissa


Era uma onda de submissão. Mas Cólera, que surgiu na zona leste de São Paulo, chegou questionando bem alto com sua guitarra distorcida e seu grito punk: Por Que Ela Não? 
Ela, porque ela não?!
Crime, discriminação
Ela não pode, não pode querer
Ela não pode, não deve pensar
Ela não pode, não pode viver
Ela não pode, não deve falar

É, as minas não tem vez
São troféus, troféus pra vocês
Sem opção, nem opinião
É a lei de um povo cão
Depois da libidinosa loba de Raul, da Maria de olhos cinzentos como as tardes sem sol de Gilberto Gil, de Todas As Mulheres e de As Loucas de Rita Lee, da Submissa de Aborto Elétrico e da pergunta que não quis calar no final da década de 70, percebe-se que o retrato da mulher começou a ganhar cor. Começou-se a retratar uma mulher desejada, ainda submissa, mas começando a ter voz. Parece que nesta década, os artistas as queriam ouvir.





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